Proximidade e menor burocracia para entrar no mercado de trabalho são os fatores que levam os brasileiros a buscar oportunidades de trabalho ou estudo nos demais países da América do Sul. Na maior parte dos casos, é preciso apenas fazer um registro de residência no local escolhido e começar a procurar emprego. O processo de validação de diplomas também é simplificado, sem exigência de provas acadêmicas.

Foram essas facilidades que levaram a advogada Renata Villela, de 35 anos, a ir para Buenos Aires, onde está há oito anos. Ela já tinha vontade de  morar fora do Brasil e ter vivência com uma outra cultura. Das opções acadêmicas que tinha como alternativa para fazer uma pós, foi na Argentina que encontrou melhores condições.

– Buenos Aires era mais perto e o câmbio mais favorável. Fiz uma pós em gestão de políticas públicas e outra em economia social. Depois disso, comecei a trabalhar para governos locais – disse.

Seu primeiro emprego foi na Secretaria de Assistência Social de Quilmes, cidade da região metropolitana de Buenos Aires, por onde ficou quatro anos. Atualmente, trabalha para o governo nacional na área de planejamento de políticas públicas. Além disso, faz parte de uma cooperativa de trabalho que possui um bar na capital portenha.

– O começo no trabalho foi complexo. É um contexto diferente. Teve a questão da adaptação à língua e aos problemas sociais do local. É uma estrutura diferente – disse.

Mesmo no período ainda de estudante, ela teve que resolver questões que não eram um problema como moravam no Brasil, como saber o nome na farmácia argentina do anti-alérgico que estava acostumada a tomar ou encontrar recomendação de um bom dentista.

Os cidadãos do Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) e dos associados ao bloco (Chile, Colômbia, Equador e Peru) têm o direito a trabalhar em qualquer um dos países e também a trabalhar ou estudar.

Sem provas acadêmicas

A revalidação dos diplomas de graduação, em grande parte, é feita de forma simplificada, necessitando apenas a verificação dos documentos e sem a necessidade de avaliações acadêmicas.

Segundo dados do Itamaraty, 505.871 brasileiros moravam nos demais países da América do Sul  no ano passado, uma queda de 10% em cinco anos.

Ainda assim, alguns países registram aumento no número de brasileiros. Esse é o caso da Argentina, que mesmo passando por uma crise financeira nos últimos anos, viu o número de brasileiros subir em 37,5%, para 64,7 mil.

Miriam Rodrigues, especialista em Gestão de Pessoas da Universidade Mackenzie, lembra que, mesmo com a menor burocracia, é importante o interessado escolher um país em que tenha demanda profissional em sua área de formação.

Além disso, embora a língua possa não parecer uma barreira, ter o domínio do espanhol é importante para a busca de emprego nos vizinhos.

– É preciso ter preocupação de como é o mercado de trabalho e saber se comunicar. Esse tipo de experiência ajuda no retorno ao Brasil. As empresas valorizam a vivência em culturas diferentes, porque entendem que o profissional terá maior facilidade de encarar problemas – disse.

No Chile, vagas para profissionais de mineração

Esse caminho Luiz Nicole, de 46 anos, já fez duas vezes. Ele já morou um período no Chile, de 2004 a 2007, e voltou em janeiro de 2016 para Santiago para trabalhar na Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), onde atua no programa de redução da pobreza rural para a América Latina.

– Vim pela oportunidade de trabalho e também pelo momento do país. Vim com esposa e filha e tem uma questão de choques de cultura e convivência com outros valores. Os chilenos são muito ordeiros. Não tem muito isso do «jeitinho» como temos no Brasil – disse.

Sobre a experiência de morar e trabalhar no exterior, ele conta que a maior dificuldade de adaptação foi da filha mais velha, hoje com 11 anos. Além disso, destaca a praticamente ausência no Chile de prestadores públicos de serviços básicos, além do estímulo ao consumo.

– Me chama muita a tenção a permanente exposição ao consumo. Isso é muito mais forte que no Brasil, que é uma economia menos aberta. E a maior parte dos serviços são públicos, dos estacionamentos nas ruas até saúde e Previdência – afirmou.

O Chile acaba tendo uma demanda maior por profissionais da área de exploração de recursos minerais e tecnologia da informação. Ainda assim, é tímida a presença de brasileiros por lá. Eram apenas 12.196 vivendo nas cidades chilenas em 2018, uma alta de apenas 1,6% em cinco anos.

O sócio da área de impostos da consultoria EY, Antonio Gil Franco, acredita que, além da situação econômica do Brasil, que leva mais profissionais a buscarem alternativas no exterior, há uma maior conscientização por parte do trabalhador de que esse tipo de experiência é importante para a carreira.

– Há poucas décadas, era necessário oferecer uma série de benefícios para remover um profissional brasileiro para outro país. Hoje, ele já vê essa oportunidade como um investimento na carreira, mesmo que em uma posição inferior. Faz parte de um profissional de sucesso a experiência internacional – disse.

Ao observar oportunidades de emprego mesmo nos países no Mercosul, em que há um acordo tribuário em vigor, Franco ressalta que é importante saber qual o imposto que será pago nesses países – a renda é tributada no país em que se recebe o salário.

No Chile, país com oportunidades na área de exploração mineral e tecnologia da informação, o IR sobre da pessoa física é de 35%. No Brasil, a alíquota máxima é de 27,5%.

Veja o que é necessário para trabalhar na região

O processo de trabalhar nos países do Mercosul ou associados é mais simples, sem necessidade de autorização para trabalhar. No entanto, alguns pontos devem ser observados.

Pesquisa

Veja o custo de vida, a oferta de emprego e os salários médios na cidade ou região que pretenda morar.

Documentos

Ao chegar no país, é preciso pedir um visto de residência, definitivo ou provisório, e com ele fazer a inscrição na seguridade social. A partir daí, já pode trabalhar legalmente.

Diploma

A validação dos diplomas é feito apenas com comprovação documental, sem necessidade de exames de avaliação.

Direitos trabalhistas

Muda de acordo com o país:

Argentina – Há 13º salário, descanso semanal e férias de acordo com o tempo de empresa (menos de 5 anos, 14 dias corridos; de 5 a 10 anos, 21 corridos; 10 a 20 anos, 28 dias corridos; mais de 20 anos, 35 dias corridos .

Chile – Não há 13º salário e as férias são de 15 dias úteis. Para quem tem mais de dez anos no mercado de trabalho, há adicional de um dia útil a cada três anos adicionais trabalhados.

Paraguai – 13º salário, período de experiência e férias também de acordo com o tempo de serviço: até cinco anos; 12 dias úteis; 5 a 10 anos; 18 dias úteis; mais de 10 anos; 30 dias úteis.